Teoria e análise argumentativa em produções discursivas multimodais: o caso do uso de advergames na discussão relativa ao humanismo digital crítico

Edilson de Souza Soares,
Isabel Cristina Michelan de Azevedo,
Iuri Michelan Barcat

Resumo

Este artigo propõe a análise de dois jogos criados pela PETA (People for Ethical Treatment of Animals)[1], classificados como exemplares do gênero discursivo advergame, a fim de entender a relação entre a produção de novas tecnologias digitais e a produção de novas formas multimodais de discurso. Argumentamos, com base em Álvaro Vieira Pinto, que a emergência dessas novas formas de produção que amalgamam texto, imagem, som, interatividade etc. e são mediadas pelas tecnologias digitais solicitam um esforço constante, por parte dos(as) pesquisadores(as), para haver discussão sobre fundamentos teórico-metodológicos que orientam as formas de análise do discurso, pela necessidade de se produzir concepções que, por um lado, apreendam os objetos em sua complexa multiplicidade, mas, por outro, possam de algum modo (re)unificar o objeto e torná-lo concreto. Com base nos conceitos da argumentação multimodal e nas noções de “produção da existência”, de “projeto” e de “tecnologia”, desenvolvidas por Vieira Pinto, propomos um procedimento analítico que permite entender a articulação entre os recursos semióticos, presentes nos advergames, e os aspectos associados ao Humanismo Digital Crítico. Os resultados obtidos indicam que, no campo da argumentação, ambos os jogos se organizam a partir de esquemas argumentativos que são instanciados com seus modais, funcionando em consórcio para a construção das semioses argumentativas; no campo ideológico, percebeu-se que, embora objetivem motivar o pensamento crítico, não criam novas condições de existência e colaboram com a manutenção do sistema capitalista vigente.


 


[1] Organização não-governamental norte-americana que tem como causa a defesa de direitos animais.

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