FALSOS SUCESSOS NO PROCESSAMENTO DO INPUT NA AQUISIÇÃO DE L2: PAPEL DA AMBIGUIDADE NA GÉNESE DO PORTUGUÊS DE MOÇAMBIQUE1

Perpétua GONÇALVES

Resumo

Neste artigo, assumindo que a mudança linguística é gerida pela aquisição, argumenta-se que as evidências de uma língua que permitem estabelecer as propriedades da sua gramática são analisadas de forma diferente, consoante essa língua é adquirida como língua materna (L1) ou como língua segunda (L2). A razão para esta diferença é que na aquisição de L2 as evidências da gramática da língua alvo podem ser ambíguas em casos em que, quando essa mesma língua é adquirida como L1, não existe ambiguidade. Para ilustrar este argumento, serão apresentados dois estudos de caso sobre o Português de Moçambique, uma variedade não-nativa adquirida por falantes de L1s bantu. Estes estudos de caso mostram que as evidências geradas pela gramática do Português europeu podem fazer emergir valores de parâmetro ‘errados/novos’ que, embora não existentes no sistema gramatical original, são perfeitamente legítimos do ponto de vista da gramática das L1s dos falantes. Em ambos os casos, embora os novos valores de parâmetro não sejam convergentes com a língua alvo, a reestruturação gramatical fica bloqueada porque os valores de parâmetro ‘errados/novos’ parecem analisar com sucesso o input. Além disso, razões extra-linguísticas também contribuem para a conservação dos valores de parâmetro ‘errados/novos’, nomeadamente o facto de a maioria dos falantes usarem o Português como L2, fazendo com que os efeitos de superfície desses valores de parâmetro ‘errados/novos’ sejam mais densos do que os que são gerados pela gramática do Português europeu.