A apresentação realizada pelo Prof. Roland Pfau objetivou mostrar um estudo tipológico sobre a negação nas línguas sinalizadas. Sua fala foi organizada em quatro grandes momentos. O primeiro foi dedicado a apresentar um panorama sobre variações tipológicas na expressão de negação. Esse panorama abrangeu, inicialmente, dois padrões: línguas sinalizadas com dominância manual e com dominância não-manual. Em um segundo momento, foram-nos mostradas ocorrências de línguas que apresentam outros padrões para expressar negação. No terceiro, o Prof. Pfau se dedicou a abordar outras estratégias para se negar nas línguas sinalizadas, podendo ser (i) orações com perguntas e respostas, (ii) concordância negativa e (iii) alçamento da negação. No quarto e último momento, o professor apresenta algumas especulações sobre o ciclo de Jespersen aplicado às línguas de sinais. Sua palestra trouxe contribuições bastante significativas para o estudo sobre a negação em línguas sinalizadas e se destaca pela vasta literatura citada
Dr. Roland Pfau’s presentation aimed to show a typological study of negation in signed languages. His talk was divided into four main topics. The first one was dedicated to presenting an overview of typological variations in the expression of negation. This overview comprehended, initially, two patterns: manual-dominant and non-manual-dominant signed languages. In the second part, we were shown occurrences of languages that present other patterns to express negation. In the third part, Dr. Pfau showed other strategies for negating in signed languages, namely, (i) question-answer constructions, (ii) negative concord and (iii) negation raising. In the fourth and last part, Dr. Pfau presents some speculations about the Jespersen’s cycle applied to signed languages. His lecture made significant contributions to the study of negation in signed languages and stands out for the vast literature cited
A apresentação do Prof. Roland Pfau objetivou mostrar um estudo tipológico sobre negação nas línguas sinalizadas
Embora ambas as línguas se assemelhem por usarem recursos manuais e não-manuais de negação, elas diferem em dois aspectos. Primeiramente, em relação ao marcador não-manual: enquanto usa-se o balançar da cabeça,
Na sequência, com relação aos recursos para a expressão de negação, o Prof. Pfau explica que as línguas sinalizadas podem apresentar
Na sequência, o palestrante traz um estudo baseado no
Finalizando a primeira parte, o Prof. Pfau reitera que o
Na segunda parte da apresentação, além da classificação binária apresentada, o Prof. Pfau levanta outros padrões de categorização possíveis para expressar a negação nas línguas sinalizadas. Os dois padrões mencionados até aqui podem ser descritos por meio de dois parâmetros: o primeiro relacionado à obrigatoriedade da presença de um negador manual e o segundo à opcionalidade do espraiamento do traço não-manual. Ambos os parâmetros podem ser marcados positiva e negativamente. Nesses termos, línguas de dominância manual são caracterizadas como sendo marcadas positivamente para o primeiro parâmetro e negativamente para o segundo (cf. LIS). Inversamente, línguas de dominância não-manual se caracterizam como marcadas negativamente para o primeiro parâmetro e positivamente para o segundo (cf. DGS). Segundo o Prof. Pfau, com base em estudos mais recentes, a RSL não se encaixa nesses padrões, pois, apesar de seu marcador manual ser de presença obrigatória, o
O professor ainda ressalta que esse espraiamento na RSL pode ir mais além, se estendendo por toda a oração e evidenciando que esse tipo de ocorrência sugere um terceiro padrão tipológico: com dominância manual
Embora a TID tenha sido considerada como u ma língua de dominância manual, portanto, sem espraiamento dos marcadores não-manuais,
Percebe-se que o
Dando continuidade, o Prof. Pfau cita um estudo mais recente sobre a língua de sinais polonesa, PJM
Com base em Johnston (2018), o Prof. Pfau indica que a língua de sinais australiana, Auslan
Na terceira parte, o Prof. Pfau traz dados de estudos recentes que adicionam outros tipos de estratégias para expressar negação nas línguas sinalizadas (CAPONIGRO; DAVIDSON, 2011; HUDDLESTONE, 2021). A primeira citada por ele diz respeito a construções que envolvem uma pergunta seguida de uma resposta negativa. Essa construção é ilustrada com o exemplo da DGS que reproduzimos em 5. Nele se observa o levantamento das sobrancelhas,
A sentença significa ‘minha mãe não comprou uma flor’, porém o sinalizante realiza uma pergunta e, em seguida, fornece a resposta negativa dessa pergunta. Segundo o Prof. Pfau, essa estratégia de negação é bastante comum na SASL. O estudo de Huddlestone (2021), baseado em dados eliciados e semi-espontâneos, totalizando 135 exemplos, indica que a SASL também se classifica como uma língua de dominância não-manual. Mais da metade das construções negativas analisadas apresentam uma estrutura de perguntas e respostas polares. Huddlestone completa que parte da resposta pode ser expressa tanto pelo
O professor menciona que, nesse exemplo, durante a expressão da pergunta, além das sobrancelhas levantadas, a sinalizante inclina a cabeça para frente, voltando à posição neutra durante a resposta.
Na sequência, o Prof. Pfau aborda uma outra estratégia para se expressar negação: a concordância negativa. Segundo ele, é esperado que quando dois elementos negativos ocorrem em uma mesma sentença eles se cancelem, porém no fenômeno denominado como 'concordância negativa’ não é isso que ocorre, pois o significado permanece negativo. O professor menciona que padrões variados podem ser encontrados na concordância negativa. Existem línguas em que a concordância negativa é a estratégia padrão para se expressar a negação. Em outros casos, é possível que a concordância negativa seja obrigatória em contextos específicos, como no caso do italiano. E, ainda, existem línguas que utilizam a concordância negativa de forma opcional, como o georgiano (ZEIJLSTRA, 2004; 2016).
Em relação às línguas sinalizadas, o professor explica que a concordância negativa padrão é atestada tanto em línguas de dominância manual como em línguas de dominância não-manual (PFAU, 2015; 2016). No primeiro caso, utiliza-se um marcador negativo manual e um outro não-manual. No segundo, utilizam-se dois marcadores manuais combinados. Nesse caso, o
Na sequência, o professor apresenta exemplos de concordância negativa opcional, retirados de dados da TID, da língua de sinais georgiana, GESL
Além desse padrão, o professor apresenta um caso especial de concordância negativa, encontrado na libras, ASL e NGT: a duplicação da negação
O Prof. Pfau reporta que na GESL a concordância negativa não é obrigatória, mas deve ocorrer em casos que apresentam tempo verbal no pretérito, orações com advérbios e modais negativos (MAKHAROBLIDZE; PFAU, 2018). Os exemplos em 9a-b ilustram contextos em que são usados tanto advérbios, ONTEM, como modais negativos, QUERER NÃO
Segundo Makharoblidze e Pfau (2018), em contextos diferentes daqueles em 9, ou seja, no pretérito e com modais negativos, a co-ocorrência de dois marcadores manuais negativos na mesma oração torna a sentença agramatical. Sendo assim, a GESL apresenta um tipo de concordância negativa específica ao tempo verbal, também atestado em línguas faladas. Nessas últimas, no entanto, a concordância nunca é restrita a um tipo específico de verbo, como modais, por exemplo (MIESTAMO, 2005).
Na sequência, o Prof. Pfau traz, de forma breve, mais uma estratégia para expressar negação: o alçamento da negação
Em 10a, a negação na oração principal ou na oração encaixada não muda o significado da mensagem, diferentemente do que ocorre em 10b. Esse fenômeno, segundo o Prof. Pfau, só ocorre com certos predicados, como
Na quarta e última parte, o Prof. Pfau traz especulações sobre o ciclo de Jespersen. Segundo o professor, línguas que exprimem um padrão pré-verbal para expressar negação podem sofrer um processo de enfraquecimento semântico e redução fonológica desse marcador. Com isso, surge uma necessidade de reforçar a negação, adicionando um outro marcador negativo pós-verbal. Com o passar do tempo, a forma pré-verbal enfraquecida desaparece e a pós-verbal se torna o negador sentencial, finalizando o ciclo Jespersen. Para ilustrar, o Prof. Pfau mostra um exemplo do francês falado. O professor divide o ciclo em quatro estágios. No primeiro, o advérbio
Para o Prof. Pfau, esse ciclo também pode ocorrer de forma semelhante nas línguas sinalizadas. Apesar de admitir a necessidade de pesquisas mais substanciais, o professor ilustra esse ciclo dizendo que o gesto manual negativo realizado com o indicador estendido e demais dedos fechados deve ter se lexicalizado como negador manual em algumas línguas de sinais. Por conta de sua frequente co-ocorrência com o
A palestra do Prof. Pfau, a nosso ver, fornece subsídios para a pesquisa da negação nas línguas sinalizadas, uma vez que ele chama a atenção para a diversidade tipológica na expressão da negação nessas línguas. Mesmo que as pesquisas sobre negação nas línguas sinalizadas sejam ainda incipientes, os trabalhos citados pelo professor em sua fala colocam em cena um vasto campo a ser investigado e colaboram para um avanço na análise linguística de línguas como a libras, por exemplo, ainda pouco estudada nesse aspecto.
Até o momento, a libras conta com apenas dois estudos sobre a negação. Brito (1995) realizou o prime iro, no qual a autora documenta três estratégias para se expressar negação nessa língua: 1) a negação através do negador manual NÃO, que pode ocorrer em posição pré-verbal ou pós-verbal; 2) a negação não-manual, que ocorre simultaneamente por meio do
ALMEIDA, L. G. P. Negação em libras. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba (em preparação).
ARROTEIA, J.
CAPONIGRO, I.; DAVIDSON, K. Ask, and tell as well: clausal question-answer pairs in ASL.
COERTS, Jane.
CRASBORN, O.; ZWITSERLOOD, I.; JOHAN, R. The Corpus NGT: A Digital Open Access Corpus of Movies and Annotations of Sign Language of the Netherlands, 2008. Disponível em:
BRITO, L. F.
DRYER, M. S. Negative Morphemes. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
DRYER, M. S. Order of Negative Morpheme and Verb. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
DRYER, M. S. Position of Negative Morpheme With Respect to Subject, Object, and Verb. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
GÖKGÖZ, K. Negation in turkish sign language: the syntax of nonmanual markers.
GÖKGÖZ, K. 2021. Negation – theoretical and experimental perspectives. In: QUER, J.; PFAU, R.; HERRMANN, A. (Eds.).
GÖKSEL, A.; KELEPIR, M. 2016. Observations on clausal complementation in Turkish Sign Language. In: PFAU, R.; STEINBACH, M.; HERRMANN, A. (Eds.).
GRAMMATICALIZATION, SIGN LANGUAGE NEGATION: TYPOLOGY AND. Conferência apresentada por Roland Pfau, 2021. 1 vídeo (1h 38min 26s). Publicado pelo canal da Associação Brasileira de Linguística. Disponível em:
HARRISON, S. 2014. The organisation of kinesic ensembles associated with negation.
HASPELMATH, M. Negative Indefinite Pronouns and Predicate Negation. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
HUDDLESTONE, K. Negation and polar question-answer clauses in South African Sign Language.
JOHNSTON, T. A corpus-based study of the role of headshaking in negation in Auslan (Australian Sign Language): Implications for signed language typology.
KENDON, A. Some uses of the headshake.
KUDER, A. Negation Markers in Polish Sign Language (PJM).
KUHN, J. 2020. Logical meaning in space: Iconic biases on quantification in sign languages.
MAKHAROBLIDZE, T.; PFAU, R. A negation-tense interaction in Georgian Sign Language.
MIESTAMO, M.
MIESTAMO, M. Symmetric and Asymmetric Standard Negation. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
MIESTAMO, M. Subtypes of Asymmetric Standard Negation. In: DRYER, M. S.; HASPELMATH, M. (Eds.).
NUNES, J.; QUADROS, R. M. Phonetically realized traces in American Sign Language and Brazilian Sign Language. In: QUER, J. (Ed.).
OOMEN, M.; PFAU, R,; KLOMP, U. On the nature of Neg-raising in Sign Language of the Netherlands.
PASALSKAYA, E. Sentential negation in Russian Sign Language.
PETRONIO, K.
PFAU, R.; QUER, J. V-to-Neg Raising and Negative Concord in Three Sign Language.
PFAU, R.; QUER, J. On the syntax of negation and modals in Catalan Sign Language and German Sign Language. In: PERNISS, P.; PFAU, R.; STEINBACH, M. (Eds.).
PFAU, R. The grammaticalization of headshakes: From head movement to negative head. In: SMITH, A. D. M.; TROUSDALE, G.; WALTEREIT, R. (Eds.).
PFAU, R. A featural approach to sign language negation. In: LARRIVÉE, P.; LEE, C. (Eds.).
PFAU, R.; MAKHAROBLIDZE, T.; ZEIJLSTRA, H. Negation and Negative Concord in Georgian Sign Languages (submetido).
QUER, J. 2012. Negation. In: PFAU, R.; STEINBACH, M.; WOLL, B. (Eds.).
RUDNEV, P.; KUZNETSOVA, A. Linearization constraints on sentential negation in Russian Sign Language are prosodic.
VAN BOVEN, C.; OOMEN, M.; PFAU, R.; RUSCH, L. Negative Concord in Sign Language of the Netherlands: Journey through a corpus. In: WEHRMEYER, E. (Ed.).
ZEIJLSTRA, H.
ZEIJLSTRA, H. Negation and negative dependencies.
Para um panorama sobre as diversas formas de negação das línguas orais ver: Dryer (2013a; 2013b; 2013c), Miestamo (2013a; 2013b) e Haspelmath (2013).
Língua de sinais da holandesa, do holandêsl
Do russo,
Do inuíte,
Do italiano,
Do sul-africano,
Do catalão,
Do polonês,
Do australiano,
Do inglês,
Neg-doubling.
Para ler mais sobre o tema, ver Pfau e Quer (2002).