A conferência apresentada por Thaïs Cristófaro Silva durante o evento Abralin Ao Vivo, foca em colaborar com alunos e interessados que desejam ingressar na área da fonologia, ou àqueles sem elementos decisivos em meio a diversidade de estudos que a priori não parecem claros. A autora desconstrói a visão ortodoxa sobre o IPA, julgando-o apenas como uma forma de representação e aponta diferentes problemas em consequência disso. Apresenta também pesquisas emergentes na área da fonética e fonologia que foram pouco exploradas, analisando fenômenos como a nasalização de vogais (e de consoantes) em finais de sílabas, palatização de oclusivas alveolares e o “apagamento” do [i] átono. E ainda, debate sobre as atuais conquistas e desafios da fonologia.
The videoconference presented by Thaïs Cristófaro Silva, during the Abralin live event, focuses on helping students and interested parties who wish to enter the field of phonology, or those who feel confused among the diversity of studies that a priori do not seem clear. The author deconstructs the religious view of the IPA, judging it only as a form of representation, and points out different problems as a consequence. It also presents emerging research in the area of phonetics and phonology that has been little explored, analyzing phenomena such as the nasalization of vowels (and consonants), at the end of syllables; palatization of alveolar occlusives and the "erasing" of unstressed [i]. And it also debates about the current achievements and challenges of phonology.
O discurso de Thaïs Cristófaro Silva
Para começo de discussão, a autora apresenta o Alfabeto Fonético Internacional (IPA –
Alguns dos símbolos do IPA foram inspirados nos símbolos alfabéticos da escrita (ex.: p (na ortografia) à /p/ (na fonologia) à [p] (na fonética); t (na ortografia) à /t/ (na fonologia à [t, tʃ] na fonética). E outros podem não ser tão semelhantes (ex.: lh (na ortografia) à /
Apoiada na pesquisa
Posteriormente, a autora fala sobre sua pesquisa usando livros didáticos, que investiga como é feita a representação fonética e fonológica das palavras, isto é, se estavam sendo devidamente utilizadas – dado a necessidade de uso de /barras transversais/ para as representações fonológicas e de [colchetes] para as fonéticas. Observou-se que, geralmente, os dados são apresentados sem colchetes ou barras transversais (ex.: aˈsĩ, aˈsiN, ‘assim’); por vezes apenas por barras transversais, sem indicar se é fonética ou fonológica (ex.: aˈsĩ, /aˈsiN/, ‘assim’); barras transversais para fonética (ex;: /aˈsĩ/). Também foram verificadas ocorrências em que se listam as formas ortográficas e indicam-se fonologicamente os símbolos correspondentes de acordo com o som explicado na unidade do livro (ex.: pintar, símbolo, sim: /iN/ ou [ĩ]). E, por fim, combinação da ortografia e da representação fonética (ex.: [in]acabado, [ĩ]feliz, [i]mortal). Então, se os símbolos são tão importantes, por que não são usados nos livros didáticos? A autora tenta justificar tal questionamento, apontando para a existência de uma semiose entre a fonética e a fonologia, e reflete que temos que, pelo menos, refletir sobre essa problemática. De fato, há uma multirepresentacionalidade fonológica que nos leva a discutir a não pertinência de uma representação única da fonologia.
Há um consenso de problemas fonológicos, pelos quais a maioria dos pesquisadores se interessam. Por outro lado, há fenômenos que estão temporalmente em épocas diferentes, que podem levar a questionamentos novos. Um deles é o fenômeno da nasalização de vogais – evoluída de uma consoante nasal que “desapareceu” com o tempo do falar brasileiro – que contrasta com a vogal oral correspondente (ex.: [a] e [ã]). No entanto, há evidências de que a nasalização da consoante está voltando a se manifestar em alguns dialetos do Português Brasileiro (PB). Esse fenômeno pode ser observado em “vamos” como [vʌm], ou em “Dona Maria” como [donmaɾiə], ou ainda em “cano torto” como [kʌntohtʊ] (CRISTÓFARO SILVA, 2020
Outro fenômeno que merece atenção é a palatização de oclusivas alveolares. Em 1970, Câmara Junior reporta a aspiração do /t/ em sílabas tônicas seguidas de [i] (ex.: tia [tˈia] à [tʃia], tinta [ˈtĩta] à [ˈtʃĩta], dia [ˈdiə] à [dʒiə], ardia [ahˈdiə] à [ahˈdʒiə]). Porém, outros estudos que investigam a palatização, identificam outras possibilidades para este fenômeno: quando as oclusivas alveolares ocorrem em posição pós-tônica e há um glide. Como, por exemplo, em “pátio”, em que há ocorrências da produção de [ˈpatʃjʊ] ou [ˈpatʃʊ], como resultado de uma assimilação do glide com o /t/. O mesmo pode ocorrer em “índio” [ˈindƷjʊ] ou [ˈindʒʊ]; pronunciar as palavras “festa” [ˈfɛstə] e “desde” [dezdɪ] como [ˈfɛʃta] e [ˈdeʒdɪ] também são exemplos de palatização por assimilação com consoante alveolar (CRISTÓFARO SILVA; OLIVEIRA-GUIMARAES; NASCIMENTO, 2012
Um terceiro fenômeno abordado foi o do “apagamento” do [i] átono. A primeira menção ao fenômeno foi através de Miriam Lemle (1966
Por fim, termina sua fala sintetizando as conquistas que deram título à palestra, e que foram abordadas gradualmente durante seu discurso. Cristófaro Silva, coloca que os avanços teóricos e metodológicos da fonética e da fonologia atualmente são abrangentes. Ferramentas novas como o uso de vídeo, ultrassom, EMA (articulografia magnética), eletropalatrografia, eletroglotografia, ressonância magnética (fMRI) e eletroencefalografia (EGG) constroem uma nova realidade. Por isso, muito se sabe sobre o PB. Por essa razão também, foi influente no reconhecimento da Libras como língua oficial, no aceitamento de línguas originárias como línguas locais de uso, e das línguas de herança. Investimentos na área possibilitaram a qualificação profissional e o surgimento de laboratórios e grupos de pesquisa, e em consequência o crescimento da pós-graduação e eventos na área. Atualmente é comum a transdisciplinaridade entre campos de estudo, gerando um tipo de conhecimento compartilhado. E, por fim, a interlocução entre pares, o aceitamento da diversidade e a cordialidade como resultado de todos esses avanços.
Contudo, embora haja grandes conquistas, a fonologia ainda tem como desafios, segundo Cristófaro Silva (2020
Os fonólogos carregam uma responsabilidade social. Por isso precisam construir argumentos sólidos e defender ideias. E faz isso preenchendo lacunas, ousando e criando o novo (CRISTÓFARO SILVA, 2020